Reunidas em uma sala de estar,
não muito ampla. Entreolham-se, demonstrando quão estranhos são uns aos outros.
Subitamente, um sujeito
entra correndo, vindo sabe-se lá de onde, com uma placa na mão. Ele grita o que está escrito ali:
- O fim está próximo! O fim está
próximo! O fim está próximo!
E da mesma forma que surge, some. Os três ficam meio que desconcertados.
- Que - cof-cof - pôrra foi aquela?
- De onde vieram VOCÊS? - Atchim! - Eu até desconfio, "sahm"... - que é "sabe?" em "tenhocertezês"...
Silêncio constrangedor.
- Bom, VOCÊ que perguntou primeiro, né, sabe-tudo? Responde, aí! Cof-cof!!
- Responde VOCÊ, ora! - Atchim! - Eu sei...
- Cof cof - então diz!
- Não vou falar... - Atchim!!! - Dá licença?!
Silêncio constrangedor 2.
- Pessoal, pessoal. Calma. Eu tenho a resposta!
A pessoa que tosse e a que espirra se voltam ao mesmo
tempo para o terceiro elemento na sala, até então em silêncio.
- Tranquilo, hein? - tentando acalmar para o que vem - Eu sou o autor deste texto.
Silêncio constrangedor 3.
- Coooooooof... tá de brincadeira?! Que texto?!
- Este, em que estamos dialogando.
- Ah, ah, ah... atchiiiiiimmmmm!!!!!!
- Quer ver? Parou a tosse...
Pausa
Pausa
- Olha, eu não estou para brin... - surpresa - minha tosse! Passou!
- Você não espirra mais, ok?
Pausa. Respira fundo pelo nariz.
Pausa. Respira fundo pelo nariz.
- Nossa! Até a coriza sumiu. Mas eu sei o porquê... deixa quieto...
- Não falei?
- Fala sério, oh engraçadão... qual é a tua?
- Bom. Tecnicamente, sou seu Deus, todo poderoso... eu criei vocês...pelo menos, aqui...
Risos nervosos.
- Verdade. Eu inventei alguns maneirismos porque vocês só existem no texto e se manifestam por palavras. Na verdade, eu fiz assim porque me deu vontade...
Menos risos.
- Perceberam que nenhum de vocês sabe se é homem ou mulher nessa história? Ah! Tirando o camaradinha que entra e sai correndo toda hora...
Zero risos.
Menos risos.
- Perceberam que nenhum de vocês sabe se é homem ou mulher nessa história? Ah! Tirando o camaradinha que entra e sai correndo toda hora...
Zero risos.
- Então tá, espertão!!! Para que você nos criou? Sobre o que é essa pôrra ?
- Vocês são metáforas para um insight
sobre a brevidade da vida e como perdemos tempo com discussões infindáveis entre gente que finge que sabe tudo e os intolerantes estúpidos...
- Rá.. eu já tinha sacado.. só não quis dizer...
-Mas é só isso? Que merda!!!!! Tantos temas importantes pra você discorrer e cria personagens pra falar de uma “bobaginha”? Todo mundo sabe que a vida é
breve! Não seja medíocre.
O cara com o cartaz entra correndo na sala de novo, vindo do nada.
- O fim está próximo! O fim está próximo! O fim está próximo!
E some outra vez.
- Eu ia dizer que a... a... a... ATCHIIIM!!!
- Interrompi com o espirro só pra mostrar aos leitores quem está
falando.
- Shfffffff ... eu ia dizer que eu sabia, tá...
- Fala, cara! Que saco! Por que Você nos criou?
- Ah... vou falar, sabe... eu acho que porque estamos chatos demais, brigando sobre qualquer coisa...
- Sabia!!!
- ... e também porque tá cheio de "sabe tudo" por aí... criticando por criticar...
- Que “Deus” vaidoso. Não pode ser criticado, né?
- Eu sei a resposta, massss... não vou dizer...
- E qual o meu sexo?
- Tanto faz. Não sei nem quem perguntou...
- Rá... já vi que é de esquerda... tá fazendo discursozinho aí... sobre
gênero...
- Oh criatura intolerante. Sua tosse vem de tudo de ruim que tá dentro
de você e volta lhe engasgando, beleza?
- Cof-cof
- E meu espirro? Eu pergunto mas eu sei, viu...
- Você tem essa doença das aparências, que precisa mostrar que sabe de tudo, que tem resposta pra tudo.. e não tem!!!
Olha só!
- Nossa... por que não caímos nas mãos de um Rubem Braga, de um Paulo
Mendes Campos, de um Luis Fernando Veríssimo, hein?.. que escritor de m...
- ... na verdade eu me inspirei num texto do Veríssimo de 1980...
- Rá!!! Cof-cof... falou, plagiador...
- É uma homenagem.
- Sei...
- Tempo... legal, papito... eu posso sentir o tempo indo embora agora...
Respiro fundo. É hora de algo mais sentimental.
Respiro fundo. É hora de algo mais sentimental.
- Vejam bem! No fim, é necessário algo mais. Não algo vindo de um "Deus"
incontestável, nem de um escritor ou pensador ou qualquer um que tente desesperadamente dar sentido a uma
reflexão. Não existe nada pronto. Construam.
Respeitem o tempo que têm. Tudo é breve. Tudo passa. Pra quê? Vão viver! Construam sua própria
história. Não gastem tempo, nem ódio, nem pensamentos, nem palavras demais.
Pausa.
Pausa.
- No caso, letrinhas geradas por um teclado... “Deus”... rá... vai
arder no inferno...
Nova pausa.
Nova pausa.
- ... que seja! A vida acontece de verdade em algum lugar e não
trancada entre palavras, devaneios vazios, suposições sem base, dúvidas
indiscriminadas, intolerância irrascível... vá tirar essas coisas de você... vá viver sua própria vida, enquanto houver
tempo!
Suspiros.
Suspiros.
- E onde é esse lugar, sabichão?
- Falo é nada, viu... hum... Deus...
Entra novamente em cena o cara com o cartaz na mão. Cof-Cof dá uma gravata nele, antes que diga qualquer
coisa. Atchim ajuda. E jura conhecer todas as respostas. Até que todos dão uma boa olhada no sujeito. Descobrem que o cara com
o cartaz dizendo que o fim está próximo sou eu mesmo, o autor deste texto.
- Já sei! Você é mágico. Já entendi o truque. Péssimo, por sinal...
- Nem vem que eu cantei a pedra muuuuito antes no grupo do whatsapp, tá?
Chega.
Chega.
- Bem! Acabou, gente.
- Acabou o quê? A inspiração? Ah, nem... Carpinejar???? Ajuda! Me dá esse notebook que eu mesmo termino isso aqui...
- Acabou o quê? A inspiração? Ah, nem... Carpinejar???? Ajuda! Me dá esse notebook que eu mesmo termino isso aqui...
- Não. Por favor, espera. Eu fingi o tempo todo! Eu não sei tudo como eu disse que sabia! Do que estamos falando, mesmo? Qual o sentido? No
fim, tudo não dá certo? Qual o caminho pra evitar esse final prematuro?
- Desculpem.
É mesmo o fim.
É mesmo o fim.
por Bob LeMont
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